O recém eleito presidente francês Emmanuel Macron declarou recentemente que “a França deve se mover e pensar como uma startup”. Por trás dessa declaração, está a necessidade de levar agilidade, flexibilidade e inovação, características das startups, para dentro do governo. Necessidades essas cada vez mais presentes em toda grande organização, especialmente nas grandes corporações.
No mercado atual, cada vez mais competitivo e globalizado, novas ofertas surgem de forma acelerada, gerando pressão por mais, melhores e mais rápidas inovações. Ao mesmo tempo, essa mesma dinâmica faz com que o ciclo de vida dos produtos se encurte. Ou seja: de um lado, inovar vai ficando mais caro e, de outro, o retorno sobre esses investimentos vai diminuindo, já que cada vez mais rápido surgem novidades substitutas, o que gera um horizonte extremamente desafiador para qualquer negócio.
Soma-se a isso uma inabilidade das grandes para inovar. Quando se fala em melhoria contínua, algumas até que vão bem, mas se o assunto é inovação radical, elas derrapam. A estrutura pesada, com várias camadas de decisão, processos internos, vícios já adquiridos e incentivos de curto prazo criam um ambiente perfeito para impedir que novas ideias prosperem. Governos são ainda piores, por lidarem com regulações e processos burocráticos ainda mais complexos.
Vários paradoxos se estabelecem aí: grandes empresas vão se tornando cada vez melhores naquilo que fazem e ironicamente, essa excelência dificulta ainda mais a inovação. Processos bem ajustados, com muitos controles criam um ambiente com pouco espaço para se propor e criar. A excelência também poder gerar um excesso de confiança, pelo qual as empresas tendem a subestimar novos entrantes, já que “as coisas sempre deram certo do jeito que fazemos”. Casos de empresas gigantes que foram sucumbidas por inovações radicais vindo de fora, como Kodak e Nokia, só para citar esses dois, estão aí para ilustrar esse ponto. Soma-se a isso o sistema de metas e bônus vigente, que incentiva resultados de curto prazo, tornando as corporações avessas a riscos e a apostas de resultado a longo prazo, elementos fundamentais para gerar inovação. Falo com conhecimento de causa de quem já trabalhou em dezenas de projetos de inovação em grandes empresas. O sistema corporativo joga contra a cultura de inovação e aqueles executivos que compram essa briga precisam remar contra a correnteza, num trabalho exaustivo e nem sempre recompensado. Lembro-me de um projeto certa vez, em que o diretor do setor de uma multinacional que o contratou foi trocado 2 vezes em um ano. Como manter um comprometimento de longo prazo nesse contexto?
Em matéria de inovação, as startups têm dado um banho nas corporações. São pequenas, ágeis e flexíveis, sempre antenadas com as mais novas tendências, tecnologias e modelos de negócio – que por si só, já trazem muitos ganhos de eficiência em relação aos processo tradicionais. Livres de amarras, processos engessados, incentivos de curto prazo e sistemas legados, elas realizam novos projetos por uma fração do custo e do tempo que as grandes usariam para construí-los. Não é a toa que tem botado medo em gigantes de todos os setores. Se o seu concorrente pode surgir do nada, como uma pequena empresa de tecnologia e sua capacidade de competir via inovação é limitada, como fazer?
Alguns as ignoram ou tratam as startups como inimigos. Acredito que caminho correto está em se aliar a elas. Há pelo menos três movimentos que as empresas podem e devem fazer nesse sentido.
Investimentos e aquisições
Se as startups fazem melhor, mais rápido e mais barato, ao invés de tentar copiá-las ou combatê-las, pode-se investir nelas! E até mesmo adquiri-las, trazendo-as para dentro de casa (com todos os riscos que processos de fusão e aquisição podem trazer). Além do M&A (merges and aquisitions) tradicional, muitas empresas estão criando fundos específicos de corporate venture capital ou investindo em fundos externos e aceleradoras que apoiam startups inovadoras. Cisco, Telefonica Vivo, Votorantin e Porto Seguro são exemplos de empresas que já fazem isso no Brasil.
Programas de relacionamento e parceria
Se não pode vencê-las, junte-se a elas! Aqui, há diversos formatos de programas de parceria e apoio a startups. Há empresas que criam formas para se tornarem clientes piloto ou gerarem projetos em conjunto com as startups – caso do Bradesco com seu InovaBRA ou próprio governo estadual de São Paulo, com o PitchGov. Outras apoiam estruturas de apoio a empreendedores, como o Cubo do Itaú. Há também aquelas que criam ou apoiam programas de aceleração específicos, como Visa, IBM e Oracle ou ainda realizam eventos de relacionamento, como hackatons – a Rede Globo é um bom exemplo deste tipo de evento. Esse tópico vale um post inteiro. Há muitas formas de relacionar e muitos erros cometidos pelas empresas. Tratar uma startup como um fornecedor tradicional por exemplo, pode matar o projeto quando ele for passar pelos processos do setor de compras e jurídico. Outro erro comum é não entender que startups fazem parte de um ecossistema, do qual se deve participar e contribuir, numa visão de colaboração e não de exploração. Um dos lemas da comunidade de startups é o #GiveFirst. Espera-se que as empresas contribuam e colaborem primeiro e construam uma relação com esse ecossistema, antes de colher os resultados.
Mudanças na cultura e estrutura internas
Embora uma corporação nunca possa se tornar uma startup, há muito o que se aprender com elas. Grandes empresas tem implementado métodos de planejamento e lançamento de produtos aprendidos com as startups, com times de projetos menores e autônomos e métodos ágeis de teste e lançamento de produtos. Também há empresas que optam por criar estruturas internas de inovação apartadas da estrutura principal, com mais agilidade e liberdade na criação de projetos. Seja qual for o caminho, muito do jeito startup pode ser aprendido e incorporado.
Fonte: Link Estadão.
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