Aneel deve aprovar nesta sexta-feira reajuste de 83% na sobretaxa da bandeira tarifária
Apesar do receio de que um aumento no preço dos produtos afaste ainda mais a demanda, indústria, comércio e empresas de logística já reconhecem que o repasse da alta na conta de luz será inevitável. Os preços devem subir em quase todos os segmentos da indústria: de têxtil a máquinas e equipamentos. Os lojistas devem repassar não só o custo maior do produto que chega do fornecedor como o desembolso mensal maior com a tarifa de energia.
E a conta de luz pode ficar ainda mais alta. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) vai examinar nesta sexta-feira a proposta para reajustar o valor cobrado no sistema de bandeiras tarifárias — aplicado quando o custo da energia sobe e as termelétricas são acionadas. No caso da bandeira vermelha, a sobretaxa hoje cobrada é de R$ 3 por cada 100 quilowats-hora (kWh) consumidos. A proposta prevê reajuste de 83%, ou seja, que o preço extra seja de R$ 5,50 por 100 kWh. No Rio, por exemplo, isso representa alta de 4,72% na conta para um cliente da Light que tenha consumo de 200 kWh, ou seja, que tenha pago na conta de janeiro R$ 105,80.
O ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, havia afirmado na quinta-feira, porém, que o reajuste da bandeira tarifária seria inferior a 50%.
Com a perspectiva de mais reajustes na conta de luz, no comércio, quem não aumenta preço, corta mimo. Vanilza Gonçalves, gerente de um salão de beleza em Botafogo, diz que a conta de luz já subiu quase R$ 800, cerca de 70%, com o uso de seis aparelhos de ar-condicionado.
— Não estamos mais ligando todos os aparelhos de ar-condicionado ao mesmo tempo. Só usamos a máquina de esterilização duas vezes por dia nos dias de mais movimento. Também paramos de usar água quente nos lavatórios, só mesmo quando a cliente pede — explica Vanilza.
Segundo o IBGE, a eletricidade subiu, em média, 17,3% para o consumidor no ano passado. Nos cálculos da Firjan, a federação das indústrias do Rio, o aumento do custo da energia para a indústria deve ser de pelo menos 34,3% este ano. A estimativa, porém, foi feita antes da Aneel considerar o reajuste da bandeira tarifária e não leva em conta também o aumento do custo de energia de Itaipu e a possibilidade de as distribuidoras pedirem reajuste extra.
— Esses ajustes que estão sendo promovidos pelo governo serão repassados aos preços, o que vai afetar negativamente as vendas, reforçando a piora no mercado de trabalho — avalia Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, que espera inflação de 7,3% e Produto Interno Bruto (PIB, soma dos bens e serviços produzidos) negativo de 1% neste ano.
Competitividade abalada
No comércio, produtos com maior previsão de alta de preços são alimentos, como arroz e feijão.
— Produtos insubstituíveis têm demanda garantida e mesmo se tiverem o preço aumentado continuarão sendo vendidos — afirma Carlos Thadeu de Freitas, chefe da divisão econômica da Confederação Nacional do Comércio (CNC).
Vitor Augusto Meira França, assessor econômico da Fecomercio-SP, pondera que a desconfiança quanto ao futuro da economia limita a capacidade de repasses, mas diz que o empresário “não está em condições de assimilar novos custos”:
— Infelizmente, a alta da conta de luz terá que ser repassada aos preços das mercadorias.
Até o transporte dos produtos ficou mais caro com a alta de R$ 0,15 do diesel na refinaria após a elevação do PIS/Cofins e a cobrança da Cide. Segundo Neuto Gonçalves dos Reis, diretor da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística), o custo do frete em produtos não duráveis, como alimentos, é de 10%. Nos duráveis, como eletrodomésticos e carros, é de 2%.
— Assim como o repasse do combustível mais caro ao frete é inevitável, o repasse ao consumidor final também é — disse.
A Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit) diz que com os produtos mais caros, a competitividade do setor é fortemente abalada. Fernando Pimentel, diretor-superintendente da Abit, estima que a eletricidade corresponde a 25% dos custos:
— O repasse ocorrerá, a dúvida é se o consumidor vai conseguir absorver o aumento.
A Abimaq, associação dos fabricantes de máquinas e equipamentos, diz que o setor usa pouca luz no processo produtivo. Mario Bernardini, diretor de competitividade da associação, estima que o peso da eletricidade no faturamento das empresas é de até 1,5%. Ele ressalta, porém, que os clientes são muito dependentes do custo da luz.
— Se tiverem de elevar preços, verão sua demanda estreitar e isso nos afetará — disse.
Fonte: O Globo
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